sexta-feira, 17 de abril de 2009

Sigilo Suspeito

Foi ontem apresentadas na Assembleia da República várias propostas para acabar de vez com o sigilo bancário. O Governo e Bloco de Esquerda (BE) degladiarem-se com as suas propostas, tendo como protagonistas o Ministro das Finanças do lado do Governo, anunciado que basta através desta nova proposta de lei, uma "mera denúncia pode levar um director de impostos a levantar o sigilo" bancário a qualquer contribuinte e cobrar 60% do "enriquecimento injustificado" em variações patrimoniais de valor igual ou superior a cem mil euros. "Esta é a resposta do Governo à corrupção e à fraude fiscal". Esta proposta vai para discussão pública e entra em vigor a 1 de Janeiro de 2010. O Fisco terá "acesso directo às contas bancárias, sem audição prévia do contribuinte", afirmou Fernando Teixeira dos Santos, após o conclave do conselho ministerial habitual das quintas-feiras.

Do lado do BE, propuseram o acesso às contas dos contribuintes, sem necessidade de autorização prévia dos juízes e, ainda, outros quatro diplomas apresentados no pacote legislativo do Bloco foram rejeitados pela maioria socialista mas, também pelo PSD e do CDS. Dois deles, um criando um imposto sobre grandes fortunas e o outro regulando o acesso ao off-shore da Madeira, contaram com o voto favorável dos deputados "alegristas" do PS (além do próprio Manuel Alegre, Teresa Portugal, Eugénia Alho e Júlia Caré). Registe-se que o líder do Bloco, Franscisco Louçã, lembrou que "tinha razão Cavaco Silva quando propôs, desde há anos, o fim do segredo bancário. Tem razão o presidente do Supremo Tribunal de Justiça, tem razão João Cravinho e tantas outras vozes (...) hoje tem de ser o dia do fim do segredo bancário, como defendido por todas estas vozes autorizadas".

O Partido Socialista (PS), comprometeu-se, dar seguimento substantivo na comissão de Assuntos Constitucionais aos três projectos do Bloco de Esquerda de regulação do sistema financeiro e combate à corrupção que ontem o PS viabilizou no plenário parlamentar, em votação na generalidade. A saber: um que prevê o fim do sigilo bancário (sem autorização judicial) para efeitos de combate à fuga ao fisco; outro que taxa em 75% os prémios excepcionais para administradores de empresas; e um outro que impõe transparência em empresas do Estado (ou subsidiadas) na revelação das remunerações dos administradores. Pela voz de Vera Jardim, o PS pretende ir mais longe do que o BE no fim do sigilo bancário, com uma aproximação ao "modelo espanhol" em "que os bancos comuniquem ao fisco, no princípio e no fim de cada ano, os saldos de cada contribuinte", para que as Finanças vejam se o que esses contribuintes pagam de impostos está conforme os seus rendimentos.

A líder social-democrata, Manuela Ferreira Leite, considerou ontem à noite que a aprovação pela Assembleia da República do "levantamento" do sigilo bancário é "uma resposta atabalhoada" à criminalização do enriquecimento ilícito que em tempos antes propôs na Assembleia. Referindo que "essa resposta veio ao fim de dois dias, com um texto de tal forma complexo, sem coerência e inexequível, que é uma jogada política sem qualquer espécie de conteúdo". Demonstrando as intenções de os social-democratas estarem "genuinamente interessados em combater seriamente todos os aspectos que se relacionam com a corrupção".

Na opinião de Paulo Rangel, líder parlamentar e cabeça de lista ás eleições europeias pelo PSD, vem dizer que penalizar com uma taxa de 60 por cento casos de enriquecimento injustificado superiores a 100 mil euros é uma clara violação da Constituição da República. Esta taxa é "uma das mais graves violações e machadadas no Estado de direito e na separação de poderes que este Governo deu ao longo destes quatro anos". "totalmente inconstitucional, pela violação do princípio do Estado de Direito e do princípio da separação de poderes". "Aplica uma pena sem que haja um processo criminal adequado, contra as garantias dos cidadãos", argumentou. "Criminaliza-se uma conduta clandestinamente, é um crime sem que se lhe chame crime. A administração fiscal é que vai investigar, julgar, acusar e aplicar a pena", assinala. trata-se "da criação de um crime fora do direito criminal, sem garantias de defesa, uma espécie de confisco, sem intervenção do Ministério Público, sem juiz de instrução, sem tribunal" pelo que considera estar-se perante um acto de “terrorismo criminal e fiscal” contra o Estado de Direito.

Na opinião de Paulo Rangel, defende que deve ser aplicada uma sanção de "100%" nos casos de enriquecimento injustificado, em vez de uma taxa de 60 por cento. Critica o governo e os socialista dizendo que "apressaram-se a aprovar uma proposta de lei que não tem qualquer cabimento, que foi feita em cima do joelho e que viola os mais elementares princípios do Direito Constitucional". O líder da bancada social-democrata reforçou que esta medida, como sendo "terrorismo criminal e fiscal" contra o Estado de direito.

Resta saber, também, quais as intenções subjacentes ao Governo e ao PS nestas matérias? Visto que ambos resolveram optar neste preciso momento, num volte-face a estas iniciativas ou demonstrar uma tentativa de um certo jogo de cintura com intuitos eleitorais? Ora, quando sabemos, que antes houve outras iniciativas anti-corrupção, como as propostas de João Cravinho há dois anos, a apresentação das propostas do PSD, que visavam criminalizar o enriquecimento ilícito e, ter dito recentemente, na voz de Vitalino Canas, porta-voz do PS, que a maioria não aprovaria uma proposta que fosse no seguimento da outra apresentada na assembleia legislativa?

Já que existe tanta boa vontade neste capítulo, por parte da maioria socialista aproveito, também, para reafirmar as questões colocadas pela líder do PSD, em relação ao destino dado às verbas gastas neste combate à crise? Qual o destino e "para quem e para onde" foram os "milhões de euros" anunciados pelo Governo como forma de combater a crise, quando os resultados vêm demonstrar o seu efeito "no sentido contrário"?

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